Terreiro Ilê Axé Icimimó Aganju Didè

18min37

Obrigação a Obaluaê. Candomblé. Afro Brasil. Pai Duda. Cachoeira. Bahia. Julho

Terreiro Ilê Axé Icimimó Aganju Didè

18:37

Obrigação a Obaluaê. Candomblé. Afro Brasil. Pai Duda. Cachoeira. Bahia. Julho

Álbum

Ilê Axé Icimimó Aganju Didé

A lua estava cheia naquela noite na Cachoeira do Recôncavo Baiano, a cidade que é África no Brasil: onde desembarcavam os navios com escravizados, reis e rainhas cuja mágica ainda estava por se manifestar. Onde também o Candomblé aportou em orixás nas cabeças dos filhos desses seus santos. Das margens do Rio Paraguaçu, que distingue pela luz prateada do final de tardes o que é Cachoeira mesmo e o que é a vizinha São Félix, saltaram barcos de histórias.

“Foi um ritual convidando os orixás para fazer a festa.

Cada dança, cada movimento, cada palavra tem um significado”

Pai Duda

A Obrigação a Obaluaê tinha começado 30 dias antes daquele 31 de julho. O orixá que é dono da Terra e com o saber da cura tinha pedido a sua oferenda há muitos anos atrás: Omolulu jovem, o guerreiro-curandeiro precisava cuidar da saúde dos seus em uma terra de tantos sofrimentos cotidianos de escravidão. Preparação-oferenda-procissão-incorporações: rituais cuidados como os búzios que fecham as guias de filhos de Santos, na única casa que ainda faz essa celebração.

“Casa forte onde só se faz o bem”: Terreiro Ilê Axé Icimimó Aganju Didé. Fundado por Pai João, filho de Xangô vindo de Nigéria, Nagô. Foi o próprio Xangô quem determinou que nessa casa só seriam feitos trabalhos positivos e que nenhum filho dos seus iria ali cobrar pelo Axé.

“As moedas nas gamelas é para limpeza,

Obaluaê está tirando as coisas negativas.

Se o homem não tivesse botado o dinheiro no centro de tudo…

o mundo seria outro”

Pai Duda

Xangô ordenou que o primeiro Babalorixá do Icimimó guardasse o dinheiro de sua cerimônia para outro fim: resgatar uma menina escravizada de 12 anos que estava por chegar de África pelo Paraguaçu. Em seu corpo negro, o outro Santo que iria assumir a casa. De lá até do dia 30 de julho de 1979, quando nasceu Duda, foram alguns pais e mães à frente desse que é um dos dez terreiros considerados patrimônios do Brasil na cidade.

Quem vê Duda em seus atabaques já sente a dignidade e concentração do Pai em tudo que ele toca. É com dedicação que hoje cuida do cotidiano e das quatro cerimônias anuais do Iciminó: dirige o que é para compartilhar enquanto também coordena o silêncio, coisa de antigo em corpo de jovem.

“Candomblé é segredo”

Pai Duda

Tem coisas que os Orixás não permitem mostrar, que é pro povo não sair imitando sem significado e sem preparo das almas e corações. Só dá pra ver que os alguidares de oferendas para Obaluaê saem em procissão ornamentada pelo branco da saúde que vai ao encontro da força da natureza: Candomblé é Deus, é Terra, é homem, é bicho, é fruto, é folha. E nada disso é melhor ou pior, é só dança e harmonia.

O Axé acontece na transição entre o visível e o invisível, na batida dos tambores. Quem viu o cozinhar das oferendas, não viu os atabaques tremendo; quem viu o escuro do transe, não sabe contar sobre as barras das saias se arrastando no chão. Celebrar a vida é se colocar com humildade entre o acende-apaga do movimento terreno-Sagrado: é exercitar um outro tipo de narrativa em que cada corpo se entrega e confia no outro pra escrever uma história que conecta o ontem, cura o hoje e liberta o amanhã.

Entrevistas

Kiko Dinucci

15min23

Entrevistas

Kiko Dinucci

15:23

Veja Mais