Álbum

Maracatu Nação

Alfaia, Conguê, Caixa, Tarol, Ganzá, Atabaque, Agbê ! Pelas ruas de Recife e Olinda, lá vão os instrumentos em baques e coreografias que fazem a energia de qualquer um dançar. Pra quem só ouviu, parece um estilo de música. Quem já chegou perto sabe: é magia.

A primeira história de um cortejo com reis e rainhas negros fazendo sons pelas cidades de Pernambuco é do século XVIII: Maracatus! Hoje celebrados como patrimônio imaterial do Brasil, antes perseguidos, eles sofreram muito preconceito e violência nos primeiros séculos de saídas. Para que cantos dos seus Orixás conseguissem ganhar as ruas, os afro brasileiros foram mais que persistentes.

Desfilando pelas ruas, um Maracatu é formado por uma corte e por um conjunto percussivo. Primeiro, um estandarte com o nome da Nação, depois o rei, a rainha e seus súditos. Olhos atentos percebem: há sempre uma mulher segurando uma boneca com panos vistosos. A Dama do Paço é personagem fundamental dos Maracatus, é figura feminina que leva em suas mãos a Calunga, a boneca que zela pelo Axé daquele povo de Santo: feitiço protegido, ninguém pode tocar. As Yabás, baianas, dançam como se seus terreiros tivessem transbordado pela cidade.

“Eparrêi!”

Saudação à Orixá Iansã

São meses para alcançar a harmonia no Baque Virado: percussão forte e acelerada, marcada por tambores grandes, ritmo que também dá nome ao Maracatu Nação. No início de cada ano, as Nações se reúnem em ensaios abertos, rituais de preparação para as festas de Carnaval. Saindo com as Nações, Bois e Caboclinhos também fazem a trilha sonora dessas ruas pernambucanas. Em 2015, um dos encantos pela capital era o Boi Maracatu de Arcoverde. O grupo começou como brinquedo para as crianças de sua cidade, encenando a história do Boi Bumbá em ritmo de Baque Virado, e logo já estava entre os destaques do Carnaval de Pernambuco.

Se os dias de ensaios aquecem os tambores e o público, uma noite é dedicada aos ancestrais. Segunda-feira é dia das almas, se é segunda de Carnaval: é Noite para Tambores Silenciosos. Para lembrar todos os anos em que os negros escravizados não podiam fazer batuque para expressar a sua fé e história, quando saíam andando escondidos com seus tambores abafados.

Desde 1968: primeiro se apresentam as Nações de Maracatu, à meia noite as luzes são apagadas e o público fica em silêncio. Os líderes dos Maracatus levam tochas acesas para a porta da igreja, algumas vozes louvam à Nossa Senhora do Rosário, tambores batem para Xangô.

“Kawô!”

 Saudação a Xangô

Eram vinte e cinco Nações de Maracatu no dia 09 de fevereiro de 2015. O Leão Coroado, fundado em 1863 e com 145 anos ininterruptos de baque, saiu do bairro de Águas Compridas guiado pelo Mestre Afonso: bateria de branco e vermelho, os mesmos instrumentos de macaúba construídos por Luís da França, filho de Xangô e um dos mestres mais importantes da história dessas nações. A Raízes de Pai Adão também levou seu Axé e tambores para celebrar o homenageado do ano: o babalorixá e juremeiro Pai Edu, fundador do Palácio de Iemanjá no Alto da Sé em Olinda, falecido em 2011.

Silêncio e velas para lembrar os tempos de opressão. Cores e tambores para Orixás e Mestres: se o Maracatu se espalhou pelo mundo através do toque das alfaias, vale lembrar as mãos dos que levaram os baques para as ruas e afinaram as tantas resistências dos negros pernambucanos.

“O melhor instrumento é corpo.”

Naná Vasconcelos

De 2002 a 2016, os ensaios estiveram sob a batuta do Mestre Naná Vasconcelos : oito vezes ganhador do Grammy como o melhor percussionista do mundo, ele dirigiu a abertura do Carnaval de Pernambuco por esses quinze anos. Sábio afinado com o Sagrado, há quem diga que Naná sentia que, depois de fazer o mundo ouvir o Brasil, teria que encaminhar os tambores de sua terra nos seus últimos Carnavais. Em março de 2016, o corpo de Naná, um dos instrumentos mais potentes do Recife, fez-se quietude.

Mas se há algo que a história dos Maracatus ensina é que um toque não morre. Mesmo quando o tempo parece silêncio, alguma alfaia ligará o chão às estrelas e, em arrepio, um menino levando seu tambor vai ouvir a afinação de um berimbau como convite para fazer o cortejo continuar.

ritual

Noite para os Tambores Silenciosos de Olinda

15min45

ritual

Noite para os Tambores Silenciosos de Olinda

15:45

ritual

Noite para os Tambores Silenciosos de Recife

12min00

ritual

Noite para os Tambores Silenciosos de Recife

12:00

outtake

Boi Maracatu de Arcoverde

10min26

outtake

Boi Maracatu de Arcoverde

10:26

outtake

Naná & Os Maracatus

04min45

outtake

Naná & Os Maracatus

04:45

Veja Mais