Terecô de Codó

Ele chega vestido dos ouros e brilhos que conquistou a partir da prática da sua Umbanda. Com muitas décadas de idade, só pode ser mesmo a força de seus ancestrais e encantados que garante a vitalidade que o sábio traz consigo. Em busca de sua ajuda para conselhos e trabalhos, todo tipo de gente, inclusive importantes políticos brasileiros, viaja até a Codó que fica a mais de trezentos quilômetros em linha reta de São Luís do Maranhão pra saber como abrir caminhos. E ainda que esses trechos Maranhão adentro revelem uma escassez de matéria - falta água, falta luz, falta escolas... - a energia abundante faz valer a jornada.

“Fé é acreditar.”

Bita do Barão

Todo mundo ali encanta, é brincante, abriga espíritos e seres misteriosos em seus corpos a dançar muitas vidas. E não tem nem hora marcada: mágica se dá é em todo canto de Codó, o tempo todo. Está presente no cotidiano de afazeres, nas prosas de famílias, nas fotos em paredes e nos fundos de gavetas.

O município maranhense tem sua história a partir das fundações de fazendas de algodão, plantio feito por negros escravizados que de lá fugiam para redutos de liberdade. Um desses endereços, Santo Antônio dos Pretos, é região quilombola do século XVIII. E é também capital da Magia no Brasil. Ou melhor, do Terecô e seus sinônimos Pajé, Encantaria de Barba Soeira ou Brinquedo de Santa Bárbara.

Palavra muito repetida por esses interiores de Maranhão, foi há poucos anos que sábios espiritualizados e pesquisadores da fé ouviram falar pela primeira vez do Terecô. A religião afro brasileira é uma colcha de retalhos ainda pouco conhecida até mesmo no Brasil. Não é somente Tambor de Mina, mas apresenta cruzamentos com seus rituais pelo menos desde o início do século XX. É uma Umbanda que segundo seus praticantes tem algumas afinidades com o Catolicismo.

"Nós gostamos muito de batismos e bençãos das imagens de nossos Santos"

Bita do Brão

Do pouco que é difundido sobre o Terecô, é com orgulho que ele é reconhecido, além de Nagô e Jejê, como Banto. Dessa nação viria inclusive o seu nome e significado: segundo a pesquisadora baiana Yeda Pessoa de Castro, Terecô é louvar e celebrar por meio de tambor. E o Tambor da Mata tocado com a mão e os maracás com suas cabaças cheias de sementes são os toques que acompanham as chegadas das entidades, dos encantados: seres que já viveram, mas que sumiram e passaram a habitar um outro espaço-tempo, um entremundo chamado encantaria. No Maranhão, são três os grupos de encantados: os de água doce na região da Baixada, os de água salgada que também são conhecidos como Tambor de Mina, os encantados da Mata da região de Codó.

Na Linha de Codó ou Linha da Mata, a entidade-chefa é Légua Bogi Buá da Trindade: um força brincalhona, vingativa e irreverente que muitas vezes é associada a Exú. No Palácio de Iansã do Bita ou na sua fazenda conhecida como Mistérios dos Encantados, chegam essas energias no tremer dos ombros, no ajoelhar o chão, no tocar a cabeça no solo. Nos festejos tradicionais da  casa são recebidos médiuns de todo o Nordeste de Brasil, como na celebração do aniversário do terreiro. O grandioso festejo dos Santos e Orixás tem sete dias de celebrações, cada um dedicado a um santo e um orixá. A festa se divide em: obrigação para São Lázaro com arreada de Acoçe, roda de cura com o Caboclo Ararum, obrigação para São Jerônimo com arreada de Xangô, obrigação de Tobossa com arreada de Princesas, obrigação para São Cosme e São Damião com arreada de Ibegê, obrigação a São Jorge com arreada para Ogum Militar, cruzamento das correntes esquerda com direita chefiada pelo Exu Tranca Rua das Almas, obrigação a São Sebastião com arreada de Oxosse, Festa de Bumba Meu Boi em obrigação a São João Batista (Xangô Caô), além da festa com Bumba Meu Boi convidados, com a realização da morte do boi.

“O médium é uma passagem, é tipo uma escada pra quem pode subir.”

 Bita do Barão

E por mais que a personalidade dessas entidades assuste a alguns, para a grande maioria são consideradas protetoras. No final, o povo Banto e de Codó conhece tanto de dor que pretende é ajudar e acolher e diminuir o sofrimento. Segundo os Comendadores e Pais-de-Santo de lá, “esse é o caminho mais certo que Deus nos guiou”.

Sendo assim, que Wilson Nonato de Souza também nos abençoe. Ele que é Bita porque menino levado que não parava quieto por aquelas bandas de Maranhão e que é também do Barão de África que nele incorpora para nos ensinar a viver melhor.

“Deus é bom pra mim

Deus é bom pra ti

Deus é bom pra nós.”

Canto durante ritual de Terecô