Álbum
Aldeia Multiétnica
Moitará: encontro entre culturas diferentes. Uma palavra que no Alto Xingu sintetiza um fazer ancestral dos que há muito andam a buscar vida - e sobrevida - pelas Américas. As rodas de saberes entre diferentes já foram cenas comuns: a intenção era conhecer, aprender, evoluir, deixar-se crescer ao tocar o conhecimento de outros. Dos endereços de escuta e sabedoria, foram rascunhadas as feiras no mapa do Brasil: de troca; assim, culturas indígenas pincelaram os primeiros pontos de uma geografia que ensaiava criatividade e respeito.
“Os povos indígenas podem mostrar uma maneira diferenciada de se viver”
Clezio Krahô
Uma só aldeia, diversos povos. A sabedoria dos ameríndios no território brasileiro compartilhada com quem quiser aprender ao longo de uma semana no meio do Brasil: na Chapada dos Veadeiros, Goiás. A paisagem de Cerrado - bioma de transição entre regiões úmidas e secas - e exuberantes cachoeiras recebem desde 2007 indígenas e não-indígenas que experimentam um universo único, com um dia dedicado a vivenciar cada uma das culturas presentes. Mais de vinte etnias já se uniram nos anos de encontro, que acolhe também pesquisadores, documentaristas, artistas e interessados na cosmologia indígena.
Feitos de cuité, um fruto de árvore do Centro-Oeste do Brasil, os maracás são os instrumentos musicais que acompanham os passos e ambientam sonoramente a presença dos Krahô. O grupo de homens e mulheres é formado por representantes das quase três mil pessoas que vivem no nordeste do estado do Tocantins. Falam Timbira, um idioma da família Jê, incluída no tronco linguístico Macro-Jê, e tem na palha um elemento onipresente em suas artes rituais e cotidianas. Desse material é a fita que ornamenta suas cabeças enquanto dançam passos ritmados em grupos ora formados somente por homens, ora formados somente por mulheres, ora mistos.
“É um encontro muito importante para conhecermos os nossos parentes,
Todo mundo fica mais forte com as reuniões e palestras”Towé Fulni-ô
No Sertão de Pernambuco, vivem cerca de cinco mil indígenas da etnia Fulni-ô, que conseguiram preservar seu idioma originário, o Ia-Tê, mesmo com mais de quinhentos anos de perseguição. Música, fogo, água, plantas e peixes… Elementos sagrados que são celebrados nos rituais, como o misterioso Ouricuri: ritual sigiloso realizado durante três meses, a partir da última semana de agosto, quando todos os indígenas Fulni-ô ficam reclusos na Aldeia Ouricuri. A entrada de outras pessoas é proibida neste período.
Com corpos pintados, cocares, saias de folhagens. Tocam flautas e fazem das mãos em palmas também instrumentos: histórias de natureza são cantadas no idioma que pra eles significa força e resistência.
“Nossa língua foi cultivada dentro dos rituais”
Cacique Tanoné Kariri-Xocó
Os Kariri-Xocó representam um grupo de menos de duas mil pessoas, formado pela junção das etnias Kariri e Xocó, que hoje moram em terras no estado nordestino de Alagoas. Algumas poucas palavras de seu idioma originário foram mantidas, na esfera dos rituais sagrados e preparo de plantas como a Jurema: a raiz é somente retirada e preparada por pajés e caciques, os principais líderes do povo.
Os Kayapó impressionam pela beleza dos corpos pintados por jenipapo, urucum e outras sementes. A pintura corporal é parte de ser humano para os cerca de seis mil indígenas que vivem em afluentes do Rio Xingu, nos estados do Mato Grosso e Pará. Com função social e mágico-religiosa, as pinturas lembram seres da natureza e trazem consigo uma linguagem ética e estética do grupo. Seu idioma, também do tronco linguístico Macro-Jê, é conservado nas aldeias ribeirinhas ao longo dos igarapés e braços menores de rios, onde as mulheres são as responsáveis pelo plantio das roças e pela arte corporal e os homens cuidam principalmente da caça e da pesca.
“Gente de verdade”, essa seria a tradução da forma como os Xavante se autodenominam. São cerca de treze mil pessoas nas proximidades da Serra do Roncador, no estado do Mato Grosso. Os Xavante pertencem linguisticamente à família linguística Jê, do tronco Macro-Jê, e são conhecidos por uma ritualística complexa, com destaque para as cerimônias de passagem para a vida adulta dos homens, que inclui o ensinamento de conhecimentos mágicos.
Da porção Sul do Parque Indígena do Xingu (uma área de reserva criada pelo Governo do Brasil com a intenção de garantir a permanência do modo de vida das culturas originárias do país) vivem os Yawalapiti em aldeia circular que guarda no seu centro a casa dos homens com flautas sagradas. São cerca de duzentos indígenas que falam o idioma Aruak e vivem basicamente da agricultura e da pesca.
“É preciso transformar a política a favor dos indígenas
E sempre dialogando com eles"Clezio Krahô
Durante os encontros na Aldeia Multiétnica, Krahô, Fulni-ô, Kariri-Xocó, Kayapó, Xavante e Yawalapiti: muitas e diferentes culturas indígenas ensinam que existem Brasis plurais também nas matas e florestas. Tantos conhecedores da natureza e da magia de ancestralidade sentam-se em uma mesma roda para conversar sobre o que os une: política, representatividade, legislação. Direitos humanos e preservação ambiental, já que não há gavetas de assuntos para separar tudo o que existe no cosmo.
“A palavra índio reduz muito
A beleza, a riqueza, a complexidade
Que os povos indígenas representam,
Isso diminui a experiência de humanidade que trazemos conosco”Daniel Munduruku, escritor e ativista indígena
O indígena aprende com a sociedade brasileira e a sociedade brasileira aprende com os indígenas. Juntos, todos dançam: se esse ensaio deixar rastros de um novo caminho, podemos nos aproximar em um modelo de humanidade não exatamente igual - porque é importante compreender e manter as diversidades -, mas mais justa.
Entrevistas
Juliano Basso
16:44
Entrevistas
Daniel Munduruku
42:44
Entrevistas
Toé Fulni-ô
03:23
Entrevistas
Tanonè Kariri-Xocó
03:37
ritual
Povo Krahô
25:30
ritual
Povo Fulni-ô
13:53
ritual
Povo Yawalapiti
06:55
ritual
Povo Xavante
09:40
ritual
Povo Kariri-Xocó
09:36
ritual
Povo Kayapó
13:53
outtake
Os Pífanos da Aldeia Multiétnica
03:37